28.10.07

Mau humor

Sou mau humorado, estou. Não que me orgulhe, mas gosto do bem gerir desta virtude. Há sim que se manter, no normal das horas, um cinza gris no conjunto. Um jeito de falar que indefere por suposto e uma superfície incógnita na face que mostra-a ao visitante como que fundas cratéras inóspitas. Há que se ter olhos fixos no breu dos próprios olhos, passagens secretas para o nível ranzinza mais subcutâneo. E atente aqui: os olhos são importantes nesta arte: olhar de mau humor não pode brecha alguma de amor ou mesmo um reluz qualquer, ainda que rápido triz, de aceno afago. Horas e horas, imóvel. i-mó-vel. Meus lábios não levantam músculos, (se é que sob lábios articulam-se músculos). O beiço faz ar de imaculado e o nariz, ainda que pudesse, não empina. O bom mau humor não é afetado. Siso sério é pleno de um mistério sem segredo, que deixa o interlocutor, mais do que intrigado: exasperado, quase sem nenhum oxigênio: obnubilado. Mesmo o tronco - que maior que tudo o mau humor desdenharia - ergue-se rijo, conciso, envergada postura, suportando em dobro os ombros que projetam a frente o peitoral. Um monstro por completo, num mudar de ventos se faz. Sem alardes ou motivos. E você. Você? Me diz o que eu faço pra te fazer feliz? Fique em silêncio, e contemple. Contemple a consistência férrea do não-diálogo. Contemple o silêncio que há nas palavras secas do rancor (brevíssimo rancor, que fique claro). Contemple o anti-riso e tenha coragem de renegá-lo. Contemple, sem dizer palavra. O mau humor jaz sem trauma e confortável nos espíritos que se entendem calados.

Um comentário:

Denis Forigo disse...

Esse negócio de mau humor é sério mesmo, olha só:

http://click.uol.com.br/?rf=hu-hn-man6&u=http://economia.uol.com.br/ultnot/valor/2007/11/01/ult1913u78197.jhtm